Textos e Sutras

> Shobogenzo Zuimonki (57) – Livro 3 Parte 9

“Portanto estudantes, se vocês desejam seguir o Caminho dos Ancestrais, nunca faça alarde da bondade. Purifique sua fé. Toda bondade se reúne onde o Caminho dos Budas e ancestrais é praticado. Uma vez que você tenha elucidado que todos os darmas (seres) são o buda-darma, você deveria saber que o mal é definitivamente mal e ele faz com que uma pessoa se afaste do Caminho dos budas e ancestrais. O bom é sempre bom e se conecta com o Caminho de Buda. Se assim o é, como você pode subestimar o mundo dos Três Tesouros?”

LIVRO 3

3-9

Um dia Dogen instruiu:

Você não deve deixar de realizar virtudes em segredo. Se você fizer boas ações secretamente, por certo receberá proteção oculta e benefício manifesto. Você deve respeitar imagens de Buda mesmo que elas sejam muito toscas, feitas de barro, madeira ou argila. Mesmo que os sutras estejam escritos em rolos grosseiros feitos de papel amarelo e presos a um rolo vermelho[1], você deve tomar refúgio neles. Mesmo que haja monges sem pudor que violam os preceitos, você deve respeitá-los e acreditar na sanga. Se você for respeitoso e se prostrar com fé em seu coração, certamente será feliz.  Embora você possa encontrar monges sem pudor, imagens brutas do Buda, ou rolos grosseiros dos sutras, se você não tiver fé e respeitá-los, você certamente receberá punição. Imagens do Buda, rolos de sutra e monges são o legado do Buda e o fundamento da felicidade para os homens e seres celestiais. Portanto, se você tomar refúgio neles e reverenciá-los, você certamente receberá seus benefícios. Se você não tiver fé, receberá punição. Não importa o quão incomumente tosco isso possa ser, você deve respeitar o mundo dos Três Tesouros.

É terrivelmente errado gostar de cometer más ações com o pretexto de que um monge Zen não pratica o bem nem acumula virtude. Nunca ouvi falar de nenhum de nossos antecessores que tenham servido como exemplos de maus atos.

O mestre Zen Tanka Tennen[2] queimou uma estátua de madeira do Buda. Embora pareça que isso não foi nada mais do que uma má ação, seu ato foi um meio de mostrar o darma. Quando lemos os registros das ações deste mestre, descobrimos que seu sentar estava sempre de acordo com as regras prescritas e, quando de pé, ele sempre teve boas maneiras. Seus modos eram sempre corteses como se estivesse se encontrando com um convidado nobre. Mesmo quando ele sentava por um curto período, sentava de pernas cruzadas e mantinha suas mãos na posição do shashu[3]. Ele protegia o patrimônio do templo como se estivesse cuidando dos próprios olhos. Ele nunca deixou de elogiar quando via alguém praticando com diligência. Mesmo que fossem pequenas, ele apreciava boas ações. Suas próprias ações, em sua vida diária, eram especialmente maravilhosas. Sua memória permanece como um espelho nos monastérios Zen.

Isso se aplica não apenas ao Mestre Zen Tanka Tennem, mas a todos os vários mestre que obtiveram o Caminho, e aos ancestrais que clarificaram o Caminho e foram reconhecidos como exemplos; todos mantiveram o comportamento prescrito pelos preceitos, conduziram a si mesmos com dignidade, e apreciaram até mesmo as mínimas bondades. Eu nunca ouvi falar de nenhum mestre do Caminho que tenha desconsiderado a bondade.

Portanto estudantes, se vocês desejam seguir o Caminho dos Ancestrais, nunca faça alarde da bondade. Purifique sua fé. Toda bondade se reúne onde o Caminho dos Budas e ancestrais é praticado. Uma vez que você tenha elucidado que todos os darmas (seres) são o buda-darma, você deveria saber que o mal é definitivamente mal e ele faz com que uma pessoa se afaste do Caminho dos budas e ancestrais. O bom é sempre bom e se conecta com o Caminho de Buda. Se assim o é, como você pode subestimar o mundo dos Três Tesouros?


[1] As escrituras budistas costumavam ser impressas em papel amarelo e presas a um bastão vermelho.

[2] Tanka Tennen (739–824) foi discípulo de Sekito Kisen. Quando ele estava hospedado em Erinji durante um rigoroso inverno, ele queimou uma estátua de madeira do Buda para se aquecer. Os monges de lá o abandonaram por isso. Ele disse a eles: “Estou queimando isso para pegar sharira”. (as relíquias do Buda). Alguém disse: “Como você pode obter sharira de um pedaço de madeira?” Tennen respondeu: “Se não podemos, então por que você me critica?” Nesta história Tanka mostrou que a estátua do Buda não é o verdadeiro Buda. Devemos ver o Buda sem forma além da forma da estátua.

[3] Shashu é uma forma de segurar as mãos. Coloque o polegar da mão esquerda no meio da palma e faça um punho em volta dela. Coloque o punho na frente do peito. Cubra o punho com a mão direita. Mantenha os cotovelos afastados do corpo formando uma linha reta com os dois antebraços. Em alguns mosteiros zen, os monges mantêm as mãos nessa posição enquanto caminham e ficam de pé.

Textos e Sutras

> Shobogenzo Zuimonki (56) – Livro 3 Parte 8

“Um antigo afirmou que se você não for igual a uma pessoa, não deve falar da conduta dela. Isso significa que se você não conheceu, nem compreendeu as virtudes de alguém, ao ver seus erros, não deveria criticá-la. Você deveria pensar que ela é uma boa pessoa embora sua ação seja má; boas pessoas também fazem coisas ruins.

LIVRO 3

3-8

Dogen também disse:

Um antigo afirmou que se você não for igual a uma pessoa, não deve falar da conduta dela. Isso significa que se você não conheceu, nem compreendeu as virtudes de alguém, ao ver seus erros, não deveria criticá-la. Você deveria pensar que ela é uma boa pessoa embora sua ação seja má; boas pessoas também fazem coisas ruins. Aceite apenas suas virtudes, não suas faltas. O provérbio que diz que um homem sábio olha para as virtudes do outro, e não para suas falhas, quer dizer o mesmo.

Textos e Sutras

> Shobogenzo Zuimonki (55) – Livro 3 Parte 7

“A profundidade da compaixão do Tatagata não pode ser alcançada nem mesmo por analogias. Tudo o que ele fez foi pelo bem de todos os seres vivos. Ele nunca fez nada que não fosse benéfico para os seres vivos. Uma vez que ele era o príncipe coroado dos cakravarti-raja (o rei que gira a roda do darma), ele poderia ter ascendido ao trono e governado o mundo da maneira que quisesse. Ele poderia ter cuidado de seus discípulos com tesouros e os criado com sua riqueza. Porque ele abriu mão de tal posição e praticou a mendicância por si mesmo? Ele se recusou a acumular riquezas e mendigou alimentos porque isso era mais benéfico aos seres vivos nas próximas gerações e para seus discípulos na prática do Caminho.

LIVRO 3

3-7

Dogen também instruiu:

Monges zen deveriam sempre ter em mente manter o modo de prática dos budas e ancestrais.

Antes de tudo, não cobice propriedade. A profundidade da compaixão do Tatagata não pode ser alcançada nem mesmo por analogias. Tudo o que ele fez foi pelo bem de todos os seres vivos. Ele nunca fez nada que não fosse benéfico para os seres vivos. Uma vez que ele era o príncipe coroado dos cakravarti-raja (o rei que gira a roda do darma)[1], ele poderia ter ascendido ao trono e governado o mundo da maneira que quisesse. Ele poderia ter cuidado de seus discípulos com tesouros e os criado com sua riqueza. Porque ele abriu mão de tal posição e praticou a mendicância por si mesmo? Ele se recusou a acumular riquezas e mendigou alimentos porque isso era mais benéfico aos seres vivos nas próximas gerações e para seus discípulos na prática do Caminho.

Desde então, todos os renomados ancestrais na Índia e na China viveram em extrema pobreza e praticaram a mendicância por alimento. Todos os ancestrais em nossa linhagem encorajaram totalmente a não acumulação de riquezas. Do mesmo modo, nas escolas de treinamento, quando as pessoas elogiam nossa escola, elas o fazem essencialmente por causa de nossa atitude diante da pobreza. Também nos livros transmitidos até a nossa era, a pobreza [dos monges Zen] foi registrada e louvada. Eu nunca ouvi falar de alguém rico de bens materiais que levasse adiante o buda-darma. Todos os praticantes sinceros do buda-darma usaram roupas remendadas e sempre mendigaram por comida. O motivo pelo qual a escola Zen foi considerada boa e os monges Zen diferentes dos outros, foi que quando os monges viveram entre os outros pela primeira vez nas construções dos templos de ensino ou das escolas de preceitos[2], eles abandonaram a preocupação com seus corpos e viveram em pobreza. Devemos lembrar disso como o estilo original de prática nesta escola (Zen).

[Não se apegar a riqueza] não é algo que devemos buscar como provas escritas nas sagradas escrituras. Em meu próprio caso, eu costumava ter minha própria terra para plantar, bem como outras propriedades. Eu também tinha minha própria riqueza. Comparando as condições do meu corpo e mente de então com minha presente condição de pobreza, de possuir apenas mantos e tigelas, sinto que meu estado mental [minha vida] nesse momento está melhor. Esta é a real prova.


[1] O ideal de rei concebido na Índia era aquele que governava o mundo com a roda que obteve no momento da entronização. Havia quatro tipos de reis, de acordo com as diferentes qualidades da roda.

[2] Antes de os mosteiros Zen serem estabelecidos, por volta da época de Hyakujo Ekai (720-814). Os monges zen ficavam nos prédios dos templos das outras escolas, ou vagavam por aqui e por ali. Eles não tinham seus próprios mosteiros.