Textos e Sutras

> Shobogenzo Zuimonki (78) – Livro 5 Parte 2

“(…) Nunca espere obter qualquer recompensa por praticar o Caminho de Buda. Uma vez que você tenha se movido na direção do Caminho de Buda, nunca olhe para trás para si mesmo. Continue praticando de acordo com as regras do buda-darma, e não se apegue a visões pessoais.”

LIVRO 5

5-2

Dogen ensinou:

Estudantes do Caminho, não aprendam o buda-darma pelo bem de seus próprios egos. Aprenda o buda-darma apenas pelo bem do buda-darma. A forma mais efetiva de realizar isso é abandonando completamente seu corpo e mente não deixando nada, e dedicando-se ao grande oceano do buda-darma.

Então, sem se preocupar com certo e errado, sem se apegar às suas próprias visões, mesmo que seja difícil fazer ou sustentar isso, você deve fazê-lo forçado pelo buda-darma. Mesmo que você queira muito fazer algo, você deveria deixar isso de lado caso não esteja de acordo com o buda-darma. Nunca espere obter qualquer recompensa por praticar o Caminho de Buda. Uma vez que você tenha se movido na direção do Caminho de Buda, nunca olhe para trás para si mesmo. Continue praticando de acordo com as regras do buda-darma, e não se apegue a visões pessoais.

Todos os exemplos de praticantes do passado foram assim. Quando você não mais busca por nada tendo por base sua mente (discriminatória), você estará em grande paz e alegria (Nirvana).

Entre leigos também, aqueles que nunca conviveram com outros e cresceram apenas dentro de suas próprias famílias, se comportam como querem e priorizam o cumprimento de seus próprios desejos. Eles nunca pensam sobre a visão dos outros e não se preocupam em como os outros se sentem. Tais pessoas sempre são más. Você deve tomar cuidado com essa mesma coisa ao praticar o Caminho. Conviva com outros (na sanga) e siga seu professor sem se apegar a visões pessoais. Se você continuar reformando sua mente (desta maneira) você facilmente se tornara uma pessoa do Caminho.

Ao praticar o Caminho, antes de tudo, você deve aprender a pobreza. Abra mão da fama e abandone o lucro, não bajule e renuncie a todos os negócios; então você se tornará um bom praticante do Caminho, sem falha. Na Grande China Song, aqueles que eram conhecidos como monges eminentes eram todos pobres. Seus mantos eram esfarrapados, e eles tinham poucas provisões.

Quando eu estive no Monastério Tendo, quem fazia os registros[1] era um monge antigo chamado Donyo, filho do primeiro ministro. Mas, uma vez que ele tinha deixado completamente sua família, e não mais desejava lucro mundano, seus mantos eram tão esfarrapados que era difícil olhar para ele. Sua virtude do Caminho, entretanto, era conhecida por outros e ele se tornou o responsável pelos registros naquele grande templo.

Certa vez eu perguntei, “Monge Donyo, você é filho de um alto oficial do governo e membro de uma família rica e nobre.  Porque as coisas que você usa são tão velhas? Porque você vive em tamanha pobreza?”

Monge Donyo respondeu, “Porque eu me tornei um monge.”


[1] Tradução de shoki, o oficial encarregado de fazer os documentos públicos, cartas, etc, no monastério Zen.

Textos e Sutras

> Shobogenzo Zuimonki (77) – Livro 5 Parte 1

“(…) O portal do dharma só é compreendido completamente quando você tem uma mente-bodai forte. Não importa quão inteligente e brilhante você seja, se lhe falta a mente bodai, se você não se desapega do egocentrismo e não consegue abandonar a fama e o lucro, você não será capaz de se tornar um homem do Caminho nem de compreender a realidade.”

LIVRO 5

5-1

Certo dia, Dogen ensinou:

Pelo bem do buda-darma, não se prenda à sua vida física. Mesmo os leigos abandonam suas vidas pelo Caminho sem se preocuparem com suas famílias; eles são leais e mantêm sua integridade. Pessoas assim são chamadas de ministros leais ou sábios.

Nos tempos antigos, quando Koso da dinastia Kan[1] entrou em guerra com um país vizinho, a mãe de um de seus ministros morava no país inimigo. Os oficiais do exército imperial suspeitavam que o ministro pudesse estar se sentindo dividido. O imperador também tinha medo de que ele mudasse para o lado inimigo por causa de sua mãe, o que resultaria na perda da guerra.

Ao mesmo tempo, sua mãe considerou a possibilidade de seu filho questionar sua lealdade por causa dela e admoestou: “Não traia seu país por minha causa. Se eu continuar viva, pode ser que você se sinta dividido em sua lealdade.”

Ela se atirou sobre uma espada e morreu. Uma vez que seu filho nunca se sentiu dividido, conta-se que ele se dedicou aos seus deveres na guerra com lealdade e firme determinação. Isso vale mais ainda para um monge Zen que aspira praticar o Caminho do Buda. Quando você está completamente livre de um coração dividido, está verdadeiramente de acordo com o Caminho do Buda.

Na prática do Caminho do Buda, alguns podem naturalmente manifestar compaixão e sabedoria desde o início. Outros, aos quais faltam tais qualidades, serão capazes de obter o Caminho se estudarem com sinceridade. Eles precisam apenas abandonar o corpo e a mente, dedicar-se ao grande oceano do buda-darma, depositar tudo nos ensinamentos do buda-darma e parar de se apegar às suas visões pessoais tendenciosas.

No reinado do fundador da dinastia Kan, um sábio ministro observou: “Remediar a desordem do mundo político é como desatar uma corda com nós. Não tenha pressa. Solte-o somente depois de examinar detidamente o nó.”

Com o Caminho do Buda é a mesma coisa. Você deve praticá-lo depois de ter compreendido profundamente os princípios do Caminho. O portal do dharma só é compreendido completamente quando você tem uma mente-bodai forte. Não importa quão inteligente e brilhante você seja, se lhe falta a mente bodai, se você não se desapega do egocentrismo e não consegue abandonar a fama e o lucro, você não será capaz de se tornar um homem do Caminho nem de compreender a realidade.


[1] O imperador Koso (reinou de 206 a 195 a.C.) foi o fundador da antiga dinastia Kan (206 a.C. a 8 d.C.). Esta história é sobre Oryo e sua mãe.

Textos e Sutras

> Shobogenzo Zuimonki (76) – Livro 4 Parte 14

“(…) Mesmo que o prédio esteja em ruínas, ele certamente é um lugar melhor para praticar zazen do que o chão ou embaixo de uma árvore. Se um setor estiver quebrado e com vazamentos, devemos nos mudar para um onde não haja vazamentos para praticar zazen. Se os monges pudessem atingir a iluminação com a construção de um salão, deveríamos construir um de ouro e de joias. A iluminação não depende de a construção ser boa ou ruim; depende apenas de nossa diligência no zazen”.

LIVRO 4

4-14

Dogen instruiu:

Quando o Mestre Zen Hoe, do Monte Yogi[1], tornou-se o abade pela primeira vez, o templo estava dilapidado e os monges estavam preocupados. Portanto, um oficial recomendou que ele fosse reparado. O mestre disse, “Mesmo que o prédio esteja em ruínas, ele certamente é um lugar melhor para praticar zazen do que o chão ou embaixo de uma árvore. Se um setor estiver quebrado e com vazamentos, devemos nos mudar para um onde não haja vazamentos para praticar zazen. Se os monges pudessem atingir a iluminação com a construção de um salão, deveríamos construir um de ouro e de joias. A iluminação não depende de a construção ser boa ou ruim; depende apenas de nossa diligência no zazen”.

No dia seguinte, em um discurso formal, ele disse: “Agora me tornei o abade de Yogi, e o teto e as paredes têm muitas rachaduras e buracos. Todo o chão está coberto de pérolas de neve, os monges encolhem os ombros de frio e suspiram na escuridão.” Depois de uma pausa, ele continuou: “Isso me lembra os antigos sábios sentados sob as árvores.”

Não apenas no Caminho do Buda, alguns têm essa mesma atitude na política. O imperador Taiso, da dinastia To, não construiu um novo palácio.

Ryuge[2] disse: “Para estudar o Caminho, antes de tudo, você aprende a pobreza. Depois de ter aprendido a pobreza e se tornado pobre, você terá intimidade com o Caminho”. Desde o tempo de Xaquiamuni, até os dias atuais, nunca vi e nem ouvi falar de um verdadeiro estudante do Caminho que possuísse grande riqueza.


[1] Discípulo de Sekiso Soen, ele foi o fundador do ramo Yogi da Escola Rinzai. Seus sucessores estabeleceram a prática do koan.

[2] Ryuge Koton, discípulo de Tozan Ryokai, fundador da Escola Soto na China.