Textos e Sutras

> Shobogenzo Zuimonki (60) – Livro 3 Parte 12

Eu passei mais de dez anos sem nenhuma posse e nunca me preocupei em como obtê-las. Pensar em acumular, mesmo que seja um pouco de riqueza, é um grande obstáculo. Sem pensar em como obter ou armazenar coisas você irá, de modo natural, receber tanto quanto precise para se manter vivo por um tempo. Cada pessoa tem sua quota atribuída; o céu e a terra nos concedem essa cota. Mesmo que você não corra por aí procurando, você irá recebê-la, com certeza.”.

LIVRO 3

3-12

Um monge disse:

“Nos monastérios na China,  uma vez que existem provisões pertencentes à sanga que compõem a propriedade permanente do templo e são usadas para apoiar a prática dos monges, os monges não precisam se preocupar com seu sustento. Como não há tais coisas neste país, abandonar todas as posses se tornará um obstáculo à prática do Caminho. Acredito que é uma boa ideia ter pessoas que ofereçam roupas e alimentos em apoio à nossa prática. O que lhe parece?”

Dogen respondeu:

“Eu discordo. Diferente da China, às vezes as pessoas neste país apoiam monges além do que é razoável, e oferecem coisas que estão além de suas possibilidades. Não posso falar sobre os outros, mas é isso que tenho verificado  e descobri que é verdade. Eu passei mais de dez anos sem nenhuma posse e nunca me preocupei em como obtê-las. Pensar em acumular, mesmo que seja um pouco de riqueza, é um grande obstáculo. Sem pensar em como obter ou armazenar coisas você irá, de modo natural, receber tanto quanto precise para se manter vivo por um tempo. Cada pessoa tem sua quota atribuída; o céu e a terra nos concedem essa cota. Mesmo que você não corra por aí procurando, você irá recebê-la, com certeza.

Desnecessário dizer, crianças do Buda receberão o legado do Tatagata; eles o obterão sem ter que procurá-lo. Estas coisas estarão naturalmente lá somente se você abandonar tudo e praticar o Caminho. Isso é uma prova evidente.”

Textos e Sutras

> Shobogenzo Zuimonki (59) – Livro 3 Parte 11

Embora muitos leigos tenham aprendido o darma desde tempos antigos, mesmo aqueles conhecidos como bons praticantes não estavam à altura dos monges. Uma vez que os monges não possuem nenhum patrimônio, a não ser os três mantos e uma tigela, nunca se preocupam a respeito de onde irão morar, e não são gananciosos em relação a comida ou vestimenta, eles obterão benefícios à medida que se devotarem a aprender o Caminho de acordo com sua capacidade. Isso ocorre por que ser pobre é estar em proximidade com o Caminho”.

LIVRO 3

3-11

Certo dia um monge chegou e perguntou sobre o que se deve ter cuidado ao aprender o Caminho. Dogen respondeu:

“Antes de qualquer coisa, uma pessoa que estuda o Caminho deve ser pobre. Se você possui grande riqueza, com certeza perderá a aspiração.

Se um leigo que está aprendendo o Caminho ainda se apega a riqueza, cobiça moradia confortável, e se mantém na companhia de parentes, mesmo tendo a aspiração, irá se confrontar com muitos obstáculos no aprendizado do Caminho.

Embora muitos leigos tenham aprendido o darma desde tempos antigos, mesmo aqueles conhecidos como bons praticantes não estavam à altura dos monges. Uma vez que os monges não possuem nenhum patrimônio, a não ser os três mantos e uma tigela, nunca se preocupam a respeito de onde irão morar, e não são gananciosos em relação a comida ou vestimenta, eles obterão benefícios à medida que se devotarem a aprender o Caminho de acordo com sua capacidade. Isso ocorre por que ser pobre é estar em proximidade com o Caminho.

Hoon[1] era um leigo, mas não era inferior aos monges; seu nome permaneceu entre os praticantes Zen. Quando começou a aprender o Zen, ele pegou todas as posses de sua família e estava prestes a jogá-las no mar. As pessoas tentaram dissuadi-lo dizendo, “Você deveria dar a outros ou usá-las pelo bem do Budismo.”

Ele respondia, “Estou as jogando fora porque acredito que elas são prejudiciais. Uma vez que acredito que são prejudiciais, como posso dá-las a outras pessoas? Riqueza é um veneno que faz adoecer tanto corpo quanto mente.”

No fim, ele as jogou no mar.

Depois disso, ele fazia cestas de bambu e as vendia para viver. Embora fosse um leigo, por ter abandonado sua riqueza, as pessoas o consideravam uma boa pessoa. E tão mais deveria um monge completamente desistir da riqueza.”


[1] Hoon (?–808), discípulo leigo de Baso Doitsu.

Textos e Sutras

> Shobogenzo Zuimonki (58) – Livro 3 Parte 10

Sem ter a mínima expectativa, mantenha os modos de conduta prescritos. Pense em agir para salvar e beneficiar os seres vivos, pratique com seriedade todas as boas ações e abandone as más ações anteriores. Faça isso apenas em prol de se tornar o fundamento da felicidade para os homens e seres celestiais. Sem estagnar em boas ações do presente, continue praticando por toda sua vida. Um ancião chamou a isso de “’quebrando o fundo do balde de laca”[2].  O Caminho dos budas e ancestrais é assim“.

LIVRO 3

3-10

Dogen também disse:

Então, se você deseja praticar o Caminho dos budas e ancestrais, você deveria praticar o Caminho dos antigos sábios e imitar a conduta dos ancestrais sem (qualquer expectativa de) lucro; não espere nada, não busque nada, não obtenha nada.

Mesmo que você deixe de buscar e abra mão de expectativas de se tornar buda, se parar de praticar e continuar se engajando em suas más ações anteriores, você ainda será culpado por buscar e retrocederá ao velho ninho[1].

Sem ter a mínima expectativa, mantenha os modos de conduta prescritos. Pense em agir para salvar e beneficiar os seres vivos, pratique com seriedade todas as boas ações e abandone as más ações anteriores. Faça isso apenas em prol de se tornar o fundamento da felicidade para os homens e seres celestiais. Sem estagnar em boas ações do presente, continue praticando por toda sua vida. Um ancião chamou a isso de “’quebrando o fundo do balde de laca”[2].  O Caminho dos budas e ancestrais é assim.


[1] O velho ninho é para onde sempre voltamos. Um tipo de moldura da qual não conseguimos sair, ou seja, a tendência ou o sistema de valores formado por nossa educação, experiências etc. É o eu cármico (ou condicionado).

[2] Um recipiente para laca. É tão preto que você não consegue distinguir entre as coisas. Esta é uma metáfora para as ilusões, ignorância e apego ao ego. Quebrar o balde de laca significa libertar-se dos sentimentos humanos condicionados.